terça-feira, 2 de junho de 2009

O Supremo e a prorrogação

Carlos Chagas

Pela palavra de seu presidente, que, aliás, não domina o voto dos dez companheiros ministros, o Supremo Tribunal Federal rejeitaria como inconstitucional o terceiro mandato para o presidente Lula, se aprovado no Congresso. Mesmo tomando como provável o vaticínio de Gilmar Mendes, surge logo outra dúvida: a mais alta corte nacional de Justiça também condenaria a prorrogação de todos os mandatos por dois anos, até 2012?

Talvez não, por uma coincidência incômoda: tramita no Congresso projeto estendendo de 70 para 75 anos o limite para as aposentadorias compulsórias, capaz de beneficiar o Supremo em peso, além, é claro, de outros tribunais e funcionários públicos sem conta. É possível que sua aprovação aconteça ainda este ano.

Seria uma prorrogação de mandatos dos meretíssimos ministros, não se tendo notícia de nenhum protesto por parte de qualquer deles. Aceitariam tranqüilos a extensão de sua permanência. Como, então, iriam insurgir-se contra a prorrogação dos mandatos do presidente da República, dos governadores, dos senadores, deputados federais e deputados estaduais? Tomariam a nova determinação como um imperativo constitucional, se aprovada.

É por aí que o vento flui, nessa discussão cujo cerne está na decisão do PT, aliados e do próprio governo de não entregar o poder aos tucanos. Para evitar a vitória de José Serra, diante das incertezas da candidatura Dilma Rousseff, só a permanência do Lula. Ainda mais se acontecer sem a necessidade de eleições.

O balão de ensaio do terceiro mandato murcha a olhos vistos, mas a estratosfera será alcançada exatamente como se pretende, através da prorrogação. E com o apoio unânime não só dos governadores e parlamentares, mas do Supremo Tribunal Federal. Sem falar no presidente da República, é claro, um fiel cumpridor da Constituição, inclusive de suas emendas...

Sobre o noticiário na TV

Cada vez com mais intensidade dedica-se o noticiário dos telejornais a temas policiais. Das emissoras de televisão populares às mais sofisticadas, perto de 65% do tempo de transmissão de seus telejornais são para crimes, assaltos, seqüestros, latrocínios, catástrofes e desgraças de toda ordem.

Trata-se de fator a ser analisado não apenas por jornalistas, mas por quantos prestam atenção nos rumos da sociedade, neste início de século XXI.

Surge linear a primeira explicação, dada pelos diretamente responsáveis sobre o que é divulgado nas telinhas: na cruel e permanente competição por audiência, o noticiário policial é o mais visto. E sem audiência não haverá patrocinadores, talvez nem emissoras. Parece guerra de foice em quarto escuro, onde não faltam excessos, trejeitos e exageros por parte de certos apresentadores, muitos transformados em falsos campeões da moralidade pública. Ou em atores com forte inclinação para o histrionismo.

Existem outras causas para essa distorção que fariam a felicidade dos sociólogos. Apesar do avanço da tecnologia e das nunca comprovadas afirmações de o país estar melhor, o povo comendo mais e o desemprego caindo, a verdade é que aumenta o sofrimento do cidadão comum, do trabalhador, a grande massa que compõe a audiência televisiva. Quem sai de madrugada para trabalhar e pena horas a fio para chegar e sair do emprego, quando se vê em casa e liga a televisão, consola-se por saber da existência de gente mais infeliz do que ele. Inconscientemente, até fica contente por não enfrentar as agruras do semelhante exposto no vídeo. A classe média, que poderia eximir-se desse sentimento, dá preferência às novelas, ao tempo em que as elites, quando dispõem de tempo, refugiam-se nos canais a cabo. Mas a massa, aquela que faz subir ou descer os índices de audiência, fixa-se no noticiário policial. Mais audiência, mais publicidade, permanece a regra.

É claro que pela ética jornalística, a sociedade deve ser informada de tudo o que se passa nela de bom e de mau, de certo e de errado, de ódio e de amor. Seria execrável censurar o noticiário policial e dar a ele tempo inferior ao necessário. Nada, porém, justifica os excessos, em especial quando praticados às custas dos demais tipos de informação imprescindíveis à formação da sociedade. Nem se fala da indução, mal capaz de advir dessa alta exposição do crime.

Em suma, é do exagero que falamos. Da diminuição progressiva, nos telejornais, de assuntos que o telespectador deveria conhecer, da economia à política, dos acontecimentos internacionais às artes e diversões. Porque continuando as coisas como vão, as redações e os estúdios de TV logo se transformarão em delegacias de polícia, necessárias em toda comunidade, mas jamais o centro da vida de todos nós.

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