quinta-feira, 21 de maio de 2009

Por cima da carne seca

Carlos Chagas

De caso pensado, o PMDB continua na contramão do governo. Mesmo preocupado em por enquanto não bater de frente com o palácio do Planalto, o maior partido nacional coleciona episódios de desentendimento, da eleição de José Sarney para presidente do Senado, contra o candidato do PT, até o apoio velado à CPI da Petrobrás. Entre esses dois episódios, registra-se uma série de pequenas desavenças, mesmo sem a intenção do rompimento imediato. São avisos, prenúncios do inevitável.

No caso, o inevitável será o desembarque do PMDB da candidatura Dilma Rousseff, caso, é claro, ela se mantenha. Por enquanto, para os peemedebistas, é bom conservar os seis ministérios, as dezenas de diretorias de empresas estatais e as centenas de cargos de escalões inferiores. O divórcio, porém, parece óbvio, apesar dos esforços que o presidente Lula fez e mais fará para manter a aliança. Porque poucos duvidam, tanto da derrota da chefe da Casa Civil, vale repetir, se ela puder seguir em frente como candidata, quanto da saída do PMDB da base oficial.

A razão é simples: o partido quer ficar onde sempre esteve, ou seja, no poder. De preferência sem os ônus, quer dizer, não apresentando candidato próprio à sucessão do ano que vem. Até porque, esse candidato não existe.

A corrente flui para José Serra, ainda que exista uma hipótese maior para tudo continuar como está, ou até ficar melhor, sem os entreveros atuais: o terceiro mandato. Caso o presidente Lula venha a ceder e aceitar concorrer a mais um período administrativo, tudo indica que será eleito. Assim, contará com o PMDB, podendo até emplacar o candidato a vice. Sabem os cardeais da legenda que serão peça-chave na armação desse golpe, porque sem os votos de suas bancadas na Câmara e no Senado nenhuma emenda constitucional será aprovada. É o que se chama, em linguagem nordestina, ficar por cima da carne seca.

Maldade

Só pode ser maldade o que o governo e os áulicos do presidente Lula, sem esquecer o próprio, andam fazendo com a ministra Dilma Rousseff. Porque uma vez caracterizada sua doença, mesmo dentro de um excepcional tratamento, a chefe da Casa Civil deveria ter sido poupada. Pelo menos nos quatro meses em que se vem submetendo à quimioterapia. É maldade ficar repetindo que ela está muito bem e que pode levar vida normal. Pior ainda, deixá-la entregue a seus afazeres de primeira-ministra e de candidata presidencial. A madrugada de terça-feira demonstrou que mesmo sem se entregar, ela precisaria estar cercada dos cuidados que a situação exige. O choque de saber que precisou embarcar num jatinho em Brasília e internar-se num hospital em São Paulo terá sido tão grande quanto o do anúncio de que tinha câncer.

Crueldade tem sido a programação que Dilma, muitas vezes, acaba não podendo cumprir, obrigada a cancelar, só nos últimos dias, sua presença no Fórum Nacional de João Paulo dos Reis Veloso, no Fórum da revista “Exame”, numa reunião plenária do PT, no Congresso de Radiodifusão e numa ida ao Ceará para explicar o PAC.

Muito melhor teria sido, para ela, licenciar-se de atividades administrativas e políticas, recolhendo-se até, esperam todos, reaparecer completamente curada e pronta para retomar a trajetória de candidata. A atual estratégia do governo só faz prejudicá-la e, ao contrário do que pretendem, enfraquece suas possibilidades.

Todos de braços cruzados

Duas semanas já se passaram desde que o Supremo Tribunal Federal considerou caduca a Lei de Imprensa, deixando perigoso vazio em termos de garantias variadas no comportamento da mídia. Nem adianta repetir que a decisão das mais alta corte nacional de justiça exprimiu mero jogo de cena, porque os artigos ditatoriais da referida lei já haviam sido revogados pelo Bom Direito, desde a promulgação na nova Constituição em 1988.

O problema é que foi tudo pelo ralo, inclusive os artigos que asseguravam o direito de resposta, a segurança da retratação como fator de paralisação de ações penais, a garantia de reparação para quem fosse ofendido em sua honra através dos meios de comunicação, a punição para quem criasse alarma no sistema bancário, a preservação de segredos de estado e tantas outras posturas essenciais ao bem-estar social.

Esperava-se, inclusive alguns ministros do Supremo, que a revogação pura e simples da Lei de Imprensa levaria imediatamente o Congresso a debater e aprovar em tempo recorde um novo conjunto legal moderno e adaptado ao século XXI. Pois até agora, nada. Nem na Câmara, nem no Senado, nem nos partidos políticos ou sequer na sociedade civil surgiram sinais de preocupação diante do vazio. É como se tudo fosse permitido, numa sociedade sem condicionamentos. A imprensa marrom deve estar em festa.

Falta a negativa principal

Apressou-se o PSDB em esclarecer que a CPI da Petrobrás jamais ousará prejudicar a empresa, que os trabalhos se desenvolverão investigando possíveis irregularidades praticadas ao longo dos anos, mas, de forma alguma, capazes de denegrir sua imagem ou atrapalhar suas atividades no país ou no mundo.

Ótimo, dos tucanos não se esperava outra coisa, ainda que, por cautela, o governo pretenda selecionar oito senadores de sua estrita confiança, entre os onze titulares da CPI.

Só que tem um problema: o PSDB foi acusado pelas lideranças oficiais de estar tramando a privatização da Petrobrás, se José Serra chegar ao poder. Sobre essa hipótese, nenhuma palavra, nenhuma negativa. Será que as oposições pretendem mesmo entregar ao mercado um dos maiores patrimônios nacionais? Seria bom que se pronunciassem o mais rápido possível.

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