segunda-feira, 25 de maio de 2009

Nenhuma aplicação pode perder para o IBGE

Pedro do Coutto

Nenhuma aplicação financeira pode perder a corrida para a taxa inflacionária do país, pelo menos a registrada pelo IBGE. Isso é lógico e evidente. Aliás, não só no Brasil, mas em qualquer parte do mundo. As aplicações em títulos públicos não podem, sob qualquer hipótese, serem envolvidas num esquema de juros negativos, como a tecnocracia classifica as operações marcadas pelo insucesso. A inflação brasileira, tanto em 2008, quanto de meio do ano passado a maio deste ano é de 5,9%. Assim, por exemplo, os títulos federais que lastreiam a dívida interna brasileira, hoje na escala de 1 trilhão e 264 bilhões de reais, têm que ser remunerados acima desse patamar. É a taxa Selic, na base de 10,25 % ao ano. Para o governo, corresponde portanto a um desembolso anual em torno de 130 bilhões.

Estou focalizando o tema a propósito de reportagem de Martha Beck, O Globo de 24/05, na qual economistas sustentam que o poder executivo terá que rever as formas de rendimento da poupança, do FGTS, e até dos fundos de pensão. Opinaram Paulo Miguel, da Quest Investimentos, Carlos Tadeu de Freitas, ex diretor do Banco Central e chefe do departamento econômico da Confederação Nacional do Comércio, e Fábio Giambiagi, do BNDES. Tem que rever por quê? Para fortalecer os fundos de investimento, claro. Mas eles não traduziram corretamente o tema. Referem-se genericamente à indexação. E daí? Não dizem, por exemplo, que todos os contratos no Brasil, exceto os do trabalho, estão indexados a algum sistema automático. Não perdem para a inflação. Ao contrário do que acontece com os salários. A defasagem social está nítida..

A consequência mais direta deste problema é o agravamento de déficite habitacional e portanto a queda dos padrões sanitários. Por trás do debate que ameaça a rentabilidade das cadernetas está – isto sim – a tentativa de colocação de mais títulos do Tesouro no mercado a serem acrescidos à dívida interna. O governo está precisando captar mais recursos, mas não quer elevar a Selic. Pelo contrário. Então o caminho é transferir indiretamente parte da poupança para os títulos que sustentem o endividamento. O saldo das cadernetas, hoje, é de 275 bilhões de reais. Noventa e nove por cento das 89 milhões de contas têm captação menor que 50 mil reais. A parcela de um por cento está acima. Mas ocorre que esta fração detém 40% do saldo total. Se o governo taxar as cadernetas e diminuir o imposto sobre os fundos, a faixa de um por cento, sem dúvida, vai se deslocar para os papéis públicos: algo em torno de 100 bilhões. É quanto o executivo pretende captar. Não pode haver outra explicação. O governo nada paga quanto às cadernetas, mas paga em relação aos títulos. Só de juros serão mais 10 bilhões por ano. Se ele não estivesse precisando de dinheiro, não faria tal operação de transferência. Surpreende que Carlos Tadeu não tenha feito esta análise. Ele conhece o assunto.

Fábio Giambiagi desfocou a interpretação. Disse a Martha Beck que se os juros da Selic, por hipótese, decrescerem a 4% ao ano, o que aconteceria? Impossível. Se a inflação anual é de 5,9%, como poderiam os papéis da dívida interna descerem a 4%. Os aplicadores (bancos) com juros negativos desapareceriam do mercado. O país seria transformado num deserto financeiro. Essa não. Arranja outra desculpa.

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