Carlos Chagas
Permanece o vazio inexplicável. A sucessão presidencial está nas ruas há quase dois anos, desde que o presidente Lula lançou (ou impôs) o nome de Dilma Rousseff. Do outro lado, firmou-se José Serra, aliás, vencedor de todas as prévias feitas desde então. O governador e a chefe da Casa Civil transitam pelo país como candidatos, participam de reuniões partidárias, inaugurações, festas populares e visitas variadas. Esforçam-se, é claro, para não quebrar a lei eleitoral. Sem muito sucesso, evitam utilizar recursos do governo federal e do governo paulista em suas viagens, mas ninguém será tão pateta a ponto de supor não estarem em campanha.
Pois é. Já que anteciparam a disputa, não se justifica o vazio relativo ao que pretendem os dois candidatos, se chegarem à presidência da República. Trata-se de uma campanha capenga. Não se esperaria, por enquanto, planos de governo, mas soa insuficiente ouvir que Dilma será uma continuação do governo Lula e Serra trará para o Planalto Central sua experiência no palácio dos Bandeirantes.
O jogo parece de mentirinha, desprezando o eleitorado, que se é levado a opinar sobre os candidatos, deveria ao menos receber informações genéricas sobre seus planos e projetos. O resultado é que de pesquisa em pesquisa, diligentemente produzidas sob as atenções gerais, mais o cidadão comum pronuncia-se movido pela simpatia. Não se dirá que opta apenas pelo sorriso dos candidatos, mas é quase isso, mesmo verificando-se que espontaneamente nenhum dos dois sorri. A imagem de Dilma, reforçada por oportuna operação plástica, não bate a carranca de Serra quando se trata das consultas populares. O vazio permanece: farão o quê, se eleitos? Nenhuma diretriz, nenhuma meta, mesmo a mais primária.
Quando chegar a hora da exposição dos programas de governo, o eleitor já terá feito sua decisão e dificilmente se deixará contaminar pelo conteúdo. Votará pela forma, isto é, pela simpatia. Pobre país.
Lembranças de Nelson Rodrigues
Cáustico, Nelson Rodrigues criticava o complexo de vira-lata de que éramos possuídos décadas atrás. A cada crise ou conflito o Brasil baixava a cabeça diante dos estrangeiros lourinhos e presunçosos do Hemisfério Norte.
Livramo-nos daquela sombra, para satisfação do genial jornalista e teatrólogo, mas, de quando em quando, verifica-se uma recaída.
A última aconteceu esta semana, quando convidado para ir a São Paulo, regiamente pago e pleno de mordomias, Bill Clinton chegou para nos humilhar, ditando diretrizes. Começa, para justificar nosso complexo de vira-lata, o nome do simpósio a que compareceu o ex-presidente americano: “Ethanol Summit”. Isso em São Paulo. Com todo o respeito, vão para o inferno seus organizadores, a União das Indústrias de Cana-de-Açúcar. Por que não “Seminário sobre o Etanol”?
Pior ficou quando o gringo abriu a boca. Disse que para transformarmos a produção do etanol num projeto energético mundial, precisaríamos, primeiro, parar de desmatar a Amazônia, provar que nossa agricultura é sustentável e não prejudicar os países mais pobres.
Deveria ter sido imediatamente convidado a se retirar do recinto, mas como a democracia comporta opiniões divergentes e até os maiores disparates, acabou aplaudidíssimo. Não houve quem se levantasse para retrucar que a Amazônia é coisa nossa, aliás, como ele negou enquanto presidente dos Estados Unidos, ao taxar a região de “patrimônio da Humanidade” e ao sugerir uma “soberania relativa” por parte do Brasil. Estamos combatendo o desmatamento, demonstra o governo, mas conforme nossos parâmetros e nossos interesses. Jamais permitiremos, no entanto, que a Amazônia sofra o mesmo fim das florestas do Meio-Oeste americano.
Ignorância maior mister Clinton demonstrou exigindo provas de que nossa agricultura é sustentável. Tanto que serve para sustentar 180 milhões de brasileiros e outro tanto de chineses, europeus e até americanos. Mais ainda, quando protestamos na Organização Mundial do Comércio contra as abusivas tarifas impostas pelos Estados Unidos a nossos produtos agrícolas. A começar pelo etanol. Pior ficou quando nos acusou de prejudicar países mais pobres. Ora, além de prejudicar, os Estados Unidos roubaram a Califórnia, o Texas, Novo México, Arizona, Colorado e quantas outras regiões que pelo próprio nome revelam ter um dia pertencido ao México, país mais pobre e prejudicado. Para não falar do Havaí e de Porto Rico, também incorporados à soberania ianque, e sem lembrar o resto do mundo onde os mais pobres saem sempre dominados e prejudicados, quando não invadidos.
Aqui para nós, o “Ethanol Summit” e seu principal conferencista nos remetem, ainda que momentaneamente, ao diagnóstico de Nelson Rodrigues.
Que beleza de capitalismo
Pediu concordata a General Motors. Havia recebido 20 bilhões de dólares do tesouro americano e agora recebeu mais 30 bilhões, para não falir. Mesmo assim, seus diretores anunciaram o fechamento de 20 fábricas e a dispensa em massa de 21 mil trabalhadores. Alguns ingênuos falam da estatização da empresa, anunciando o fim do neoliberalismo e o surgimento de uma nova ordem econômica mundial.
Infelizmente, não é nada disso. Quem demonstrou foi o presidente Barack Obama, para quem a GM continuará atuando sem influência do governo de Washington, a não ser em certas decisões fundamentais.
Capitalismo assim é uma beleza. Na hora dos prejuízos, o poder público socorre, os pequenos acionistas se arrebentam e os operários vão para a estratosfera. Quando a empresa lucrava horrores, beneficiavam-se especialmente seus diretores, com polpudas gratificações fixadas por eles mesmo. Agora, permanecerão em seus cargos, fora uma ou outra troca.
Por falar nisso: já terá passado dos 100 bilhões de reais o aporte de recursos públicos a bancos e indústrias nacionais ou sediadas em território nacional, por conta da crise econômica. Da mesma forma, não teve o governo Lula, até agora, coragem para exigir das empresas beneficiadas que parassem de demitir. Privatizar o lucro, socializar as perdas - permanece regra fundamental. Depois, anacrônicos somos nós, que denunciamos a farra...
Melhor matar os velhinhos
A mesa do Senado, quer dizer, o senador José Sarney, deixou para futuro incerto a marcação do dia em que o Congresso apreciará veto do presidente Lula negando a todos os aposentados reajuste igual ao concedido àqueles de salário mínimo. A pressão do palácio do Planalto funciona de forma avassaladora, sob o pretexto de que o reajuste levaria a Previdência Social à falência. Começa que não é verdade, e, depois, se fosse assim, bastaria aplicar nas contas públicas o sistema de vasos comunicantes. Se falta dinheiro na Previdência Social – e não falta – que tal usar recursos provenientes dessa cascata de impostos que nos assola?
O resultado é que os aposentados, de ano para ano, tem suas aposentadorias achatadas. Não demora muito, estarão todos nivelados por baixo, recebendo apenas o salário mínimo. Fora, é claro, certas categorias privilegiadas, entre as quais se incluem deputados e senadores.
Ninguém reage, no Congresso, a essa manobra protelatória de seus comandantes. Nem o senador Paulo Paim, até pouco defensor intransigente dos direitos dos aposentados. A imagem é velha mas merece ser repetida: que tal Câmara e Senado inaugurarem o busto de Herodes em seu plenário, com o cuidado de botá-lo de cabeça para baixo? Da primeira vez ele mandou matar todos os bebês. Agora, cuidaria dos velhinhos...
quarta-feira, 3 de junho de 2009
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Aposentadorias. Quem viu a atuação do Paim e quem vê. A mesma metamorfose aconteceu com seu Partido. Antigamente chamava-se Partido dos Trabalhadores. Hoje, Partido dos Trambiqueiros. Eles só vão tentar um arremedo do antigo Partido se perderem o Poder em Brasília. Aí voltarão a defender os fracos e oprimidos, com a sua costumeira demagogia. Se continuarem no Poder, continuarão a defender os frascos e comprimidos.
ResponderExcluirMartim Berto Fuchs.