sexta-feira, 15 de maio de 2009

Carta a um amigo

Ao meu querido Helio Fernandes

Estou aqui na minha fazenda, em Paraíba do Sul, que é ao mesmo tempo o meu templo de paz e também de reflexão. Penso no amigo, nos seus anos de luta e de grandes empreendimentos à frente do Jornal Tribuna da Imprensa. E, inspirada em suas palavras divulgadas pela mídia, também quero acreditar que o jornal fez apenas uma interrupção momentânea.


Há quase 50 anos, a leitura do jornal Tribuna da Imprensa passou a fazer parte da minha vida. E quando me dei conta da sua falta, tive um choque. E por que demorei a me manifestar? A explicação lógica é que estive viajando muito nos últimos meses, o que é mesmo verdade, mas existem também motivos emocionais.

Assim como a arqueologia, que habita e povoa a minha memória diariamente, seu jornal - sob sua regência há 47 anos - me acompanhou e alimentou de informações e notícias todo esse tempo. Estou de luto. Mexendo no baú da memória, lembro da perda do Helio, meu marido, e do quanto ele também nutria por você. Talvez tudo isso explique o meu silêncio. Espero que me compreenda.

Cercada da natureza bonita e preservada da Fazenda Maravilha, posso agora compartilhar com você a minha tristeza. Aqui, querido amigo, me alimento da terra e aprendo com ela diariamente. Nossa Terra mãe é muito resistente, assim como a Tribuna da Imprensa, que já faz parte da história do Brasil.

Um abraço terno, da amiga de sempre,

Maria Beltrão


Resposta de Helio Fernandes

Querida e reverenciada amiga,

Você, Maria, faz parte de uma lista privilegiada (na mente e no coração), que não precisa de manifestações ocasionais ou circunstanciais. Você estará sempre presente e a distância só valoriza o carinho, a ternura, a amizade, pois percorremos uma estrada inteira sem nenhuma derrapagem na solidariedade.

Tivermos como alicerce e argamassa dessa convivência a admiração mútua pelo Helio, teu marido e meu amigo de uma vida inteira. Tantas lembranças do Helio, antes e depois com você, que poderia recordar tantas e tantas coisas. Sempre com a habitual grandeza dele, o espirito publico, a sensibilidade e a credibilidade, em todos os cargos e fora deles. Resumirei tudo num episodio mais do que revelador.

Foi em 1966, quando o Helio completava 50 anos, amigos ofereceram a ele um almoço no restaurante da Mesbla. Pela manhã, telefonei para ele, dei o abraço e as felicitações do amigo, e comuniquei: "Helio, desculpe, não irei ao teu almoço. Não quero criar problemas. Estou cassado, o governo me prende e me persegue de todas as maneiras, mas o general Costa e Silva, sabiamente, convocou você para ministro, a minha presença pode ser um complicador." 

Resposta fulminante: "Se você não for, eu também não vou."

Lógico, como sabia que ele estava sendo sincero, acabei indo. A minha cassação não tinha sentido, era pura injustiça, como injustiça continua sendo a tua não eleição para a Academia, apesar de ter tido duas vezes 16 votos. A tua não-vitória (não quero pensar em escrever a palavra derrota) é depreciativa para a Academia e não para você. Não conheço ninguém que honraria tanto a Academia.

Carinho, satisfação, respeito e consideração do amigo

Helio Fernandes

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